SOLENIDADE DA ascensão do senhor
8 de maio de 2016
Liturgia da Palavra: At
1, 1-11; Sl
46 (47) Ef
1, 17-23; Lc
24, 46-53
Mensagem-Tema:
O Senhor subiu aos céus e está sentado à direita de Deus Pai
Sentimento:
Os discípulos voltaram para Jerusalém com grande júbilo
Imagem:
Cena da Ascensão
Introdução
Celebramos hoje a solenidade da Ascensão
do Senhor. Depois de, durante quarenta dias, ter aparecido a algumas
mulheres e aos apóstolos afim de testemunhar sua ressureição, o
Senhor “se elevou à vista deles”, isto é, “subiu aos céus,
onde está sentado à direita de Deus Pai todo-poderoso” (Credo).
- Ascensão e Ressurreição
Nos Atos dos Apóstolos, ao anunciar o
mistério da Ascensão, Lucas tanto diz que Jesus “se elevou”,
como, também, que “foi arrebatado ao céu” (At 1,1-11). Também
Marcos fala em arrebatamento: “Então, o Senhor Jesus, depois de
lhes ter falado, foi arrebatado ao céu e sentou-se à direita de
Deus” (Mc 16, 19). O Apóstolo Paulo, por sua vez, ser refere à
Ascensão como o coroamento do “sublime
Mistério da Piedade”
(tò tes eusebeías mystérion),
isto é, da misericórdia que veio morar entre nós; mistério que,
em última instância, é o próprio Cristo decantado, pelo próprio
Paulo, com este breve, mas magnífico hino: “Ele foi manifestado na
carne, / justificado no Espírito, / contemplado pelos anjos,
proclamado entre os gentios, / crido no cosmo, / arrebatado na
glória” (1 Tm 3, 16).
O mistério da Ascensão, portanto forma
uma unidade com o mistério da Ressurreição. Sem aquele este não
teria nenhum sentido, ficaria sem graça, sem nenhum benefício. Por
isso, segundo João, no dia da Ressurreição, Jesus dá a Maria de
Mágdala a tarefa de comunicar esta mensagem aos Apóstolos: “Eu
subo para o meu Pai, que é vosso Pai, para o meu Deus, que é o
vosso Deus” (Jo 20, 18). Enfim, Cruz, Ressurreição e a Ascensão
é a mesma e única exaltação de Jesus Cristo.
- Ascensão e Envio
Lucas, além de testemunhar a Ascensão
como conclusão do mistério pascal ele a apresenta também como
preparação para o aviamento da missão dos Apóstolos. Por isso e
para isso revela que naquela ocasião o Senhor “abriu-lhes o
intelecto (nous)
para que assim compreendessem as Escrituras”, isto é, sua paixão,
crucificação e ressurreição; pediu-lhes, também, que em seu nome
fizessem o anúncio da “metánoia”
(conversão, transformação do pensamento) e do perdão dos pecados
“a todos os povos, a começar por Jerusalém”. Finalmente, depois
de instituir os Apóstolos como testemunhas (mártyres)
de tudo isso, ele fala do envio do Espírito Santo. “E eis que eu
enviarei a Promessa
do meu Pai sobre vós” (Lc 24,49).
O Espírito Santo é chamado aqui de “a
Promessa
do Pai”. Isso quer dizer: o Espírito Santo, que o Cristo recebe do
Pai e comunica aos que, em todos os povos, creem no Evangelho, é o
cumprimento, a plenitude, a realização consumada, da divina
revelação de Deus na história da salvação. O Cristo é o
portador e o comunicador do Espírito. Manifesta-se assim a Obra
trinitária da Salvação! O Pai que unge, o Filho que é o ungido
(Messias, Cristo), e o Espírito Santo que é a unção, isto é, o
vigor e a alegria de Deus: a “Potência”
(Dýnamis).
Tanto é que, logo em seguida, no Evangelho de hoje, o Espírito
Santo é chamado simplesmente de “Potência”
(Dýnamis):
“Quanto a vós, permanecei na cidade (Jerusalém) até que sejais
revestidos, do alto, pela Potência”
(Lc 24,49).
Nunca é demais insistir que será
somente mediante a investidura desta Potência do Pai que aqueles
homens frágeis, simples pescadores, de alma mesquinha e
interesseira, fechados em si mesmos, poderão dar conta da grandeza
da incumbência que acabavam de receber: ser testemunhas do Cristo
Crucificado e Ressuscitado por toda a terra. Assim, cumprirão sua
incumbência não baseados no poder humano, mas no vigor, na virtude,
na potência, que vem do Alto. É o mesmo Espírito de que fala o
Anjo na anunciação a Maria e que, após o Batismo conduz Jesus
pelas tentações no deserto à Galileia, para começar o seu
ministério; o mesmo Espírito de que fala Lucas na leitura do Atos
dos Apóstolos, proclamada hoje: “recebereis uma força, a potência
do Espírito Santo que virá sobre vós” (Atos 1, 8).
Nos tempos antigos a unção, ou melhor,
o óleo com que alguém era untado, ungido significava a penetração
do vigor, da potência de Deus. Os reis eram ungidos. Devemos notar,
pois, que ao despedir-se dos Apóstolos, Jesus o faz como o Ungido (o
Cristo), que ele era e que ele mostrou ser, pela sua paixão e
ressurreição. Por isso, sua derradeira despedida se dá de modo
solene, semelhante à liturgia da unção de um rei: num gesto de
homenagem régia e religiosa os Apóstolos se prostram diante dele
para receber a bênção, a unção, a Potência do alto a fim de
conseguirem testemunhar com paciência o mistério do amor
misericordioso do Pai, assim como Ele, o Mestre e Senhor, o
testemunhara até a morte e morte de Cruz. Se Cristo era o ungido do
Pai, eles, agora, se tornam os ungidos, os “cristos” do Cristo,
enviados a todos os povos, por toda a terra, para anunciar a alegria
do Reino de Deus, o Evangelho.
A Ascensão, portanto, é também a
solenidade do envio ou do aviamento da Missão dos Apóstolos, da
Igreja, do cristão. Este parece ser o sentido da fala dos dois
homens vestidos de branco que apareceram aos apóstolos: “Homens da
Galileia, por que ficais aí a olhar para o céu?” Ou seja,
acordem! Acabou a missão de Jesus. Agora está começando a de
vocês.
- Ascenção de Jesus: primícia da elevação de toda a humanidade e de toda a criação
O Evangelho de Lucas termina falando da
alegria dos Apóstolos. “Quanto a eles, após se terem prostrado
diante dele voltaram para Jerusalém, com grande júbilo, e estavam
sem cessar no Templo, bendizendo a Deus” (Lc 24, 52-53). Mas, qual
o motivo de tão grande júbilo se o Mestre se ausentara,
corporalmente, do meio deles? Segundo os Padres da Igreja Cristo é
arrebatado ao céu como aquele que vai a nossa frente, abrindo
caminho, para a nossa própria ascensão ao céu. O seu corpo é
primícia dos que, permanecendo ainda neste mundo, vivem da esperança
de um dia também serem elevados ao céu, para junto do Pai. N’Ele,
a nossa natureza é honrada e elevada, recebendo todas as virtudes
dos anjos e sendo introduzida diante da Majestade divina. São João
Crisóstomo assevera que “teu corpo será igualmente levado aos
céus, porque o teu corpo é da mesma natureza que o corpo de Jesus
Cristo”.
Nós e Cristo somos, na verdade, um só
corpo. A segunda leitura de hoje, tirada da Epístola aos Efésios,
nos lembra disso: Cristo, que o “Pai da glória”, com sua
Potência, ressuscitou dos mortos e colocou à sua direita nos céus,
acima de todas as coisas, isto é, de todos os seres, corporais e
espirituais, é a cabeça, isto é, o Princípio, de toda a Igreja,
que é o seu corpo. Se somos um único corpo, e se a Cabeça já
entrou no céu, então também o corpo entrará, sim, até mesmo a
última parte do corpo, isto é, os pés, ou seja, os mais humildes
da Igreja, serão recebidos no céu, diante do “Deus de Nosso
Senhor Jesus Cristo, o Pai da glória”. Todavia, não apenas nós,
mas toda a criação conosco rejubila porque também ela participa
desta elevação para junto do Pai comum, o Pai das misericórdias,
pois, como diz São Paulo: tudo é vosso, vós sois de Cristo e
Cristo é de Deus. Assim, Cristo é, como diz a epístola de hoje, “a
plenitude (tó pleroma)
que plenifica o todo em todas as coisas” (Ef 1, 23). A Ascensão de
Cristo é, pois, a plenificação do cosmos. Por isso, segundo Santo
Agostinho, para Jesus Cristo, “ir para o Pai e distanciar-se de nós
significava mudar em imortal quanto de mortal ele tinha assumido de
nós, e elevar ao mais alto do céu a natureza terrena da qual, por
nós, ele tinha se revestido”.
Em Cristo, nossa humilde natureza, com
sua corporeidade, isto é, com sua finitude, foi elevada ao céu e
entronizada junto do “Pai da glória”. Como, então, não nos
alegrar? “Quem não se alegrará, se ama Cristo, quem não se
congratulará com aquela natureza mortal feita imortal, na esperança
de que isso aconteça também com ele? ” (Agostinho). São Cirilo
de Alexandria, por sua vez, diz que, com sua Ascensão, Cristo
inaugura um caminho novo e vivo, um caminho que antes era
intransitável, isto é, o caminho que dá acesso ao céu, ou melhor,
ao Santuário celeste, como diz a Epístola aos Hebreus: “Cristo
não entrou num santuário feito por mãos humanas, figura do
verdadeiro, mas no próprio Céu, para Se apresentar agora na
presença de Deus em nosso favor” (Hb 9, 24). Os Padres gostam de
meditar no espanto dos anjos, ao verem algo de extraordinário: um
homem, um mortal, ascender às esferas celestiais, e sentar-se no
mais alto dos céus, à direita de Deus Pai.
Recordemos ainda que, assim como “o
Senhor Jesus Cristo não deixou o céu quando de lá desceu até nós,
também não nos deixou quando subiu novamente ao céu” (Santo
Agostinho). Foi o que os dois homens vestidos de branco asseveraram
aos Apóstolos: “Este Jesus que acaba de ser arrebatado para o céu
voltará do mesmo modo que o vistes subir para o céu” (At 1,11).
Por isso, daqui a alguns dias o mistério de hoje será completado
com a vinda do Espírito Santo. Enquanto a parousía,
isto é, o retorno de Cristo glorioso não acontecer, os tempos e os
espaços, na terra, se alargarão, para que a alegria do Evangelho
possa atravessar gerações e gerações até o fim do mundo, e possa
se difundir, com a comunicação universal do Espírito Santo a todos
os povos, até os confins da terra.
Conclusão
Se, portanto, com Cristo já estamos
sentados à direita do Pai, jubilosos, a exemplo de São Francisco,
vivamos neste mundo como cidadãos celestes; se como os Apóstolos
fomos ungidos e revestidos com o vigor e a alegria da Potência de
Deus, o Espírito Santo, para evangelizar todos os povos, sejamos
cristãos “em saída” combatendo sempre em nós mesmos e ao nosso
redor, o mundanismo espiritual de nossa autorreferencialidade (Papa
Francisco na EG 93-97).
Marcos Aurélio Fernandes e Frei
Dorvalino Fassini
Informações: dorvalinofassini@gmail.com
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