Frei Dorvalino Fassini, OFM
Em sua Exortação apostólica Evangelii Gaudium (EG 231-233), o papa Francisco, ao falar da construção de uma sociedade justa, fraterna e pacífica proclama que, apesar de necessárias e importantes, as ideias sempre devem dar a primazia à realidade ou melhor: aquelas devem estar sempre a serviço dessa. Do contrário constroem-se casas sobre a areia, vidas e sociedades repletas de idealismos e nominalismos ineficazes porque vazios, ocos, sem nada, sem nenhum conteúdo por dentro, puro “blá-blá-blá”.
Esse princípio pode e deve ser aplicado também ao trabalho de nossa Formação religiosa. Movidos por uma cultura que há séculos primeireia os conceitos e as ideias não percebemos mais que nossa formação está cada vez mais vazia porque não parte da dinâmica do encontro ou confronto com a realidade de todas as realidades de nossa existência de consagrados franciscanos: a gratuidade do toque do encontro, da afeição pelo modo de ser ou espírito de São Francisco.
Na raiz desse princípio está toda a pedagogia de Deus formar, organizar e conduzir seu Povo tanto no Antigo como no Novo Testamento. Nosso Deus não é uma fantasia, uma ideia, mas uma Pessoa, um Deus “real” cuja Palavra se encarna em cada pessoa, criatura ou acontecimento. Daí a insistência do Papa: Não pôr em prática, não levar à realidade a Palavra é construir sobre a areia, permanecer na pura ideia e degenerar em intimismos e gnosticismos que não dão fruto, que esterilizam o seu dinamismo (233). Ou ainda, como diz São Tiago, uma fé sem obras não existe, está morta.
Quem mostra e descreve muito bem como, na escola franciscana, se faz a formação a partir do encontro e confronto com a realidade, são os Evangelhos e as Fontes Franciscanas. Aí não há nada de idéias ou conceitos. É tudo, do começo ao fim, debate, corpo a corpo, com atitudes, modos de ser, gestos, pensamentos, graças e virtudes vindos do Evangelho e da inspiração originária que moveu Francisco e toda aquela plêiade de companheiros e companheiras.
Poder-se-ia dizer, então, que a formação, para nós franciscanos, é a arte de confrontar-se não apenas com as ideias, as palavras, os conceitos, as doutrinas (catolicismo, franciscanismo), mas, acima de tudo, com as “coisas” do “chamado e do seguimento de Cristo pobre e crucificado” pulsantes em todo e qualquer leproso de hoje.
Ouçamos, pois essa contundente e admirável conclusão do Papa: Não me cansarei de repetir estas palavras de Bento XVI que nos levam ao centro do Evangelho: «Ao início do ser cristão, não há uma decisão ética ou uma grande ideia, mas o encontro com um acontecimento, com uma Pessoa que dá à vida um novo horizonte e, desta forma, o rumo decisivo». Somente graças a este encontro – ou reencontro – com o amor de Deus, que se converte em amizade feliz, é que somos resgatados da nossa consciência isolada e da auto-referencialidade (EG 7-8).
Nenhum comentário:
Postar um comentário