I DOMINGO DO ADVENTO
29/11/2015
Ano C
Liturgia da Palavra: Jr 33, 14-16; Sl 25, 4-5; 8-10; 14 (Resposta: 25, 1b); 1Ts 3, 12 – 4,2;
Lc 21, 25-28; 34-36
NO SENHOR QUE VEIO E QUE VIRÁ COMEÇAR TUDO E SEMPRE DE NOVO
Esta palavra grega, “Parousía”, foi traduzida para o latim como “adventus”, que quer dizer “ato de chegar”, “chegada”, “vinda”. Para o Novo Testamento, a “Parousía” significa a reaparição e o retorno de Cristo “na plenitude do poder e da glória” (Lc 21, 27). Retorno, pois, Jesus Cristo já apareceu e já veio uma vez pelo seu nascimento humilde na carne de nossa humanidade – mistério que celebraremos em breve na solenidade da Natividade do Senhor, o Natal.
A primeira leitura de Hoje já nos dá um primeiro vislumbre deste mistério, ao reportar a leitura do profeta Jeremias, em que se dá a promessa de Deus de fazer brotar na descendência de Davi “um rebento legítimo que defenderá o direito e a justiça”. Os profetas nos mostram que o Reino de Deus penetra sempre mais a fundo no homem e no mundo, transformando-os até a sua realidade mais íntima e elevando tudo aquilo que é terreno e transitório ao nível da salvação divina que abarca não somente o ser humano, mas todo o universo, a criação toda, nossa Casa comum e, por fim, garantindo a suprema harmonia entre céu e terra, o homem e Deus.
No mesmo sentido da profecia de Jeremias, Isaías, personagem importante na liturgia deste advento, nos falará da “rama” que brota da “cepa de Jessé” (Is 11, 1-2). O Cristo é o que consuma o reinado de Deus, que é o reinado do direito e da justiça, pois, na sua regência tudo se ergue com retidão e todas as coisas são conduzidas para a sua justeza e harmonia definitivas. O Cristo é também chamado por Isaías de “fruto da terra” e de “Germe” (Is 4, 2), nos remetendo para o mistério da encarnação, em que o Filho de Deus germina da terra, isto é, de nossa humanidade, inaugurando o reinado da justiça que se consumará, por sua vez, na “Parousía”.
A pergunta, porém, que se nos impõe neste domingo, frente à promessa da consumação do reinado de Deus na encarnação e na “Parousía” definitiva de Cristo é: como devemos, enquanto cristãos, viver o tempo de nossa vida, a partir do nosso relacionamento com Nosso Senhor Jesus Cristo? Que atitudes nós devemos cultivar neste relacionamento? Podemos responder: as atitudes que devemos cultivar são a fé, a esperança e o amor-caridade-doação.
O nosso relacionamento fundamental com Cristo chama-se fé. A fé é um modo de realizar a vida. Fé é mais do que crença, ou seja, é mais do que ter algo por verdadeiro. Também é mais do que uma pura e simples confiança. Fé é um modo de caminhar na vida e agradar a Deus (1 Ts 4, 1). Por isto, para nós, cristãos, não basta simplesmente crer que Cristo, no fim dos tempos, virá do céu para “julgar os vivos e os mortos”. É preciso que esta fé se transforme em um esperar Cristo e amar Cristo, um amor que se concretiza no amor aos homens. Decisivo, na nossa vida, é a esperança em Cristo. O cristão é um homem que tem esperança e sua esperança está ancorada em Cristo. A esperança, por sua vez, se desdobra em várias outras atitudes.
Ter esperança, para o cristão, não é meramente nutrir expectativas, mas é um esperar crente, serviçal, alegre, vigilante, amante e paciente na aflição. Uma atitude fundamental da esperança cristã é a vigilância. O evangelho de hoje chama a atenção para a vigilância em relação ao próprio coração: “ficai de sobreaviso para que os vossos corações não fiquem pesados pela embriaguez, pelas orgias e pelas preocupações da vida e que esse dia não caia sobre vós de modo imprevisto como uma armadilha” (Lc 21, 34). Justamente por manter-se sóbrio e vigilante na espera da vinda inesperada de Cristo é que o cristão não vive o seu tempo apoiado em expectativas sobre as coisas penúltimas e sobre as suas seguranças, esquecido das coisas últimas e definitivas. Pelo contrário, ele vive desprendido destas expectativas, ancorado apenas naquilo que dá o sentido definitivo de sua vida: o encontro com Cristo. À vigilância há que se acrescentar a oração incessante. É preciso que vigiemos e que rezemos a todo o momento, nos assinala o evangelho de hoje (Lc 21, 36). Quem vive assim, na fé e na esperança em Cristo, não deve temer os apertos, as precisões, as tribulações, nem os abalos e as perplexidades da história, nem mesmo os mais extremos (Lc 21, 25-26). Pois, quem assim vive, ficará de pé “diante do Filho do Homem” no momento do juízo definitivo sobre a história e as vidas de todos os homens (cfr. Lc 21, 36).
A esperança cristã, porém, se consuma no amor. Paulo, na segunda leitura de hoje, diz: “Que o Senhor faça crescer e superabundar o amor” (1 Ts 3, 12). Esta “superabundância do amor” é o cerne do Sermão da Montanha, o discurso em que está resumido o essencial do viver cristão (Mt 5-7). A fé, a esperança e o amor superabundante fortalecem o coração do homem em face de Deus Pai e o prepara para o Advento glorioso de Cristo. Coloquemos hoje e sempre, no Senhor, a nossa confiança, como nos ensina o salmista no salmo de hoje (Sl 24/25). Digamos a ele: “faze-me conhecer os teus caminhos, Senhor; ensina-me tuas veredas. Faze-me caminhar para a tua verdade e ensina-me, és o Deus que me salva. Eu te espero o dia inteiro” (v. 4-5). Se confiarmo-nos ao Senhor ele também se confiará a nós, conforme nos diz ainda o salmo que recitamos hoje: “O Senhor se confia àqueles que o temem, dando-lhes a conhecer a sua aliança” (v. 14). Que possamos, pois, com a confiança que vem da fé, da esperança e do amor, caminhar nos caminhos do senhor, diante dele em “santidade irrepreensível”, como disse o Apóstolo Paulo (1 Ts 3, 13). Para que possamos isso, que o Senhor mesmo nos ajude. Amém.
(Marcos Fernandes)